Os caminhos para a inovação
A montagem de um projeto e o desenvolvimento de produtos exigem um longo período de planejamento.
O desenvolvimento de produtos inovadores não é algo que ocorre de repente, exige planejamento e bastante investimento das empresas. Ao realizar um histórico do investimento de inovação no Brasil, o ex-ministro de Ciência e Tecnologia e ex-presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Sérgio Rezende, cita a dificuldade que empresas inovadoras brasileiras tinham em investir no desenvolvimento de produtos dada a alta carga de tributos existente no Brasil. Era algo praticamente impossível, tanto que Embraco e Mahle – Metal Leve acabaram vendidas para grupos estrangeiros mais tarde, para que pudessem acompanhar as tendências tecnológicas e competir em pé de igualdade com os demais fornecedores globais.
A situação começou a mudar no final da década de 90 e início dos anos 2000. Em 2003, o governo formulou uma política mais clara de integração para as pesquisas feitas em universidades e institutos de pesquisa com a cooperação de empresas interessadas. A Lei de Inovação Tecnoló- gica, aprovada em 2004, também foi uma mudança importante, dando origem a Lei do Bem e outros mecanismos para permitir incentivos fiscais, muitas vezes, reembolsáveis, por parte das empresas que investem em inovação.
Diferentes caminhos são escolhidos, dependendo da empresa no desenvolvimento de projetos para inovação de produtos e processos. Algumas apostam no pedido de patentes, como a Bosch, terceira colocada no ranking de depósitos mundiais, com uma média de 16 depósitos por dia,
enquanto a Weg tem uma média de oito por ano. Isso não diminui a importância das inovações tecnológicas dentro dessas empresas e consolida a necessidade de um planejamento a longo prazo.
A limitação de considerar apenas as opiniões de clientes na montagem do projeto nem sempre contribui para o êxito de uma melhoria.
Estudo de campo para validar opiniões
Uma nova plataforma para construção de motores que pudesse ser aplicada às suas 150 linhas de produtos foi um dos maiores projetos desenvolvidos pela Weg, fabricante multinacional com sede em Jaraguá do Sul (SC), nos últimos cinco anos. O projeto foi iniciado em 2007 e se desenrolou durante dois anos até que o conceito das novas características comuns, a serem aplicadas nas diversas linhas de produtos, fosse concluído. Um dos principais objetivos era a diminuição do ruído provocado pelo motor, uma vez que uma pesquisa de mercado realizada pela empresa identificou este quesito como o principal fator que levava os clientes a reconhecerem o produto como de melhor qualidade. Em 2011, 80% do faturamento bruto da empresa foi gerado por produtos lançados nos últimos cinco anos, o que representou um faturamento de R$ 6,1 bilhões.
Um ponto observado pelo engenheiro de projetos é que a limitação de considerar apenas as opiniões de clientes na montagem do projeto nem sempre contribui para o êxito de uma melhoria. “Após realizarmos pesquisas para saber quais eram as necessidades, percebemos que havia muita informação desencontrada e que nem sempre os clientes sabem exatamente o que querem“, comenta Nau. Isso não significa que não seja necessário seguir algumas tendências gerais de mercado, como a redução de custos do produto, a quantidade de material utilizado e uma maior vida útil aos equipamentos.
Essa não é uma conclusão isolada. O levantamento em campo das reais condições operacionais do etanol por parte da Bosch foi fundamental para o desenvolvimento da tecnologia flex fuel, iniciada no final dos anos 90. No início dos anos 2000, a Bosch começou a ter atritos com as montadoras na questão da garantia, porque os carros estavam apresentando problemas diante da má qualidade do combustível usado no Brasil. O chefe do desenvolvimento de produtos em tecnologia de combustíveis da Bosch em Campinas, Celso Fávero, lembra que a discussão na época era que mobilizar o governo para uma mudança na regulamentação dos combustíveis levaria muito tempo e não faria sentido responsabilizar o usuário final que abasteceu em um posto com combustível de baixa qualidade. A partir de então, a empresa investiu em pesquisa de campo e na contratação de especialistas para descobrir a real composição do combustível presente nos postos de gasolina do país e identificar todos os produtos aos quais a bomba de combustível do carro deveria estar preparada para resistir. ”
Você precisa olhar o que de fato está no seu campo de trabalho e entender como é o seu mercado. Nem sempre as especificações de clientes estão de acordo com a realidade brasileira, porque vinham da matriz no exterior“, conta Fávero. O esforço de vários anos transformou o Brasil no centro de competência mundial para componentes flex fuel e hoje são feitas consultas diárias por parte de outras plantas no mundo para a transferência de tecnologia. “Nesse caso, o custo no Brasil nos pressionou para a busca de uma alternativa ao desenvolvimento local, para podermos competir em nível global“, avalia o engenheiro.
As pesquisas também resultaram nas primeiras normas em combustíveis agressivos. Existem trabalhos em conjunto com o Inmetro para a implantação de uma norma brasileira para bombas de combustível e, no próximo ano, entra uma certificação compulsória para vários componentes. A Bosch também é responsável pela produção de 95% das válvulas de combustível do mercado brasileiro.
Nacionalização de produtos
Hoje, há 875 empresas que recebem os benefícios da FINEP como empresas inovadoras. A maioria delas é formada por grandes empresas. Uma das explicações para este quadro é que o modelo de renúncia fiscal está baseado na declaração de lucro real das empresas, opção geralmente escolhida pelas maiores. Outro motivo é o desconhecimento por parte das médias empresas da possibilidade de incentivo. Uma pesquisa da Fundação Dom Cabral mostra que há um grande desconhecimento por parte das médias empresas no acesso a créditos para inovação.
O engenheiro mecânico Márcio Meinhardt iniciou sua empresa, a Centrifugar, em 2000 com a distribuição de centrífugas importadas para opera- ções de saneamento. O crescimento da demanda para máquinas na cadeia de produção de petróleo fez com que a empresa de Nova Friburgo (RJ) passasse a importar máquinas destinadas a este setor. Com o tempo, começou a fabricar peças de reposição para as máquinas que ele revendia e, em seguida, a fabricar centrífugas para tratamento de emulsões oleosas. Em 2005, instalaram a primeira centrífuga em Niterói e três anos depois entregaram a segunda máquina em Santos. Em 2010, passaram a integrar um projeto, o Programa Plataformas Tecnológicas (Platec), da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip).
Os projetos principais são o desenvolvimento de uma máquina nacional para trabalhar em navio, com o propósito de purificar o óleo combustível e lubrificante, e outra para tratar a lama de perfuração offshore. A empresa já produz máquinas para lama de perfuração, mas o tamanho ainda impede que ela seja levada para plataformas de petróleo.
As novas legislações que preveem o correto destino de produtos contaminantes tornam as máquinas desenvolvidas pela Centrifugar uma demanda real e crescente com os investimentos previstos para o pré-sal. O fluido de perfuração tem uma vida útil e pode ser reaproveitado dentro das plataformas de petróleo; mas, na hora do descarte, a lama que contém o fluido é levada diretamente ao aterro ou é incinerada, pois possui diversos contaminantes. O diretor da Centrifugar explica que a máquina é capaz de separar o óleo que tem na lama para que possa aumentar sua vida útil na perfuração ou possa ser usado como combustível. A água presente nesta composição também é tratada e pode ser reutilizada e o que sobra é apenas 5% que vai para o aterro, mas como todo o óleo é retirado, o nível de poluição é muito menor. Com esse projeto junto à FINEP o objetivo é desenvolver todo esse equipamento para as plataformas offshore. O projeto já está aprovado e a empresa aguarda a liberação dos recursos.
Para Meinhardt, o trabalho em conjunto com a Coppe é importante por conta da medição, padronização dos processos e certificação das máquinas no final da produção. “Aprendi a construir essas máquinas, porque as importava, identificava seus problemas, fazia peças para reposição e, aos poucos, desenvolvi a competência para produzir o equipamento inteiro“. O empresário lembra que ainda há um longo caminho de pesquisas pela frente e “a parceria com a universidade foi o salto que a empresa precisava para deixar de ser pequena”, avalia o diretor.
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