A chegada do robô Curiosity a Marte e o papel da integração de processos
A operação mais complexa já realizada: o projeto levou 10 anos para ser concluído.
A 40 mil milhas por hora, uma espécie de disco voador se dirige a Marte. Próximo à superfície do planeta, a velocidade está reduzida a 13 mil milhas e em sete segundos será levada a zero. A cápsula protetora se abre e o robô Curiosity é alçado para a superfície do planeta vermelho. A operação ocorrida no dia 5 de agosto é considerada a mais complexa realizada pela NASA (National Aeronautics and Space Administration).
O robô é responsável por coletar material para diversas frentes de pesquisa, análise de solo, condições e composição da atmosfera e clima. A complexidade do robô desenvolvido permite, pela primeira vez, que ele colete sedimentos de rochas após perfurá-las, armazene em compartimentos internos, execute alguns processamentos e envie informações à Terra. Com base nessas informações, que incluem fotografias extremamente detalhadas, é possível aos pesquisadores, dos vários laboratórios da agência espacial, fazerem uma análise precisa do solo do planeta vizinho – apesar da distância. No momento, ainda não é possível trazer o equipamento de volta à Terra a fim de se fazer ensaios e testes com as amostras coletadas.
Levar o Curisioty a Marte é um projeto que se iniciou há 10 anos e foi coordenado pelo Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) situado em Pasadena, na Califórnia. O JPL é um dos 10 centros de pesquisa da NASA distribuídos pelos Estados Unidos, mas não é coordenado diretamente pela agência espacial, e sim pela Universidade de Caltech.
A construção do braço mecânico do Curiosity, responsável pela coleta de material na superfície de Marte, envio de fotos e dados é a parte mais complexa da estrutura robótica. “Brincamos que o robô é um braço mecânico com rodas”, disse o líder de projeto de sistemas mecânicos do Laboratório de Ciências de Marte (MSL), William Allen, durante a sua participação no evento Siemens PLM Connection, realizado em novembro de 2012, na cidade de São Paulo. Para coordenar os movimentos e realizar a captura de dados, um hardware chamado MLS foi desenvolvido. A fabricação de peças, componentes, hardwares e softwares, costuma ser feita internamente pelos engenheiros dos centros de pesquisa da NASA e alguns colaboradores. Ainda que as missões se encerrem, para o engenheiro, 90% do que é pesquisado está em constante transformação. Por exemplo, o Phenolic Impregnated Carbon Ablator (PICA), material utilizado para a proteção externa, quanto à questão das variações de temperatura, foi utilizado pela primeira vez em 2007, em outra operação, e foi adotado novamente neste projeto.
Cada missão deve durar, em média, cinco anos e a complexidade deste robô dobrou o tempo do projeto. Em 2003, quando a elaboração começou, estava claro que o software de PLM (Product Lifecicle Management) utilizado à época não daria conta do que estava sendo proposto. O principal problema era a falta de integração entre os módulos, o que forçava os engenheiros a muitas horas de retrabalho. “Integração talvez seja a palavra-chave neste projeto. Principalmente quando falamos na operação de separação do robô de sua proteção no espaço”, diz William Allen. Esse foi um dos principais pontos que os levaram a adotar o software de PLM Teamcenter da Siemens.
Diariamente, o robô Curiosity recebe uma lista de tarefas sobre os dados que devem ser coletados durante o dia, mas sua programação permite que execute ações de forma autônoma e defina as tarefas que serão executadas em primeiro lugar. Isso significa que nem todas as ações requisitadas serão concluídas no mesmo dia.
A computação gráfica e simulação consomem duas vezes mais tempo do que a modelagem dos componentes. Allen lembra que é preciso prever inúmeras situações, mudanças de temperatura, clima, todas as forças atuantes sobre o robô. “Trabalhamos com cerca de 100 mil componentes e, para isso, contamos com a participação de diversos colaboradores entre pesquisadores de outros institutos de pesquisa e empresas. Mais de 2 mil pontos foram considerados, nunca fizemos uma simulação desta magnitude”.
Allen prefere não mencionar as margens de erro com as quais trabalham. Lembra quantas simulações foram feitas e, no limite, a redução das margens também significa um maior custo. O engenheiro mecânico e diretor de marketing para as Américas da Siemens, Troy Vanderhoof, reforça o pensamento de Allen e brinca: “Quando se pesquisa, não é possível ter certeza de tudo. Temos que ter a sorte das coisas falharem o mais rápido possível para fazermos melhor”.
As melhorias no robô continuam sendo feitas constantemente pela equipe que gerencia o hardware MSL. A mais recente mudança foi o ajuste do Curiosity para operar no fuso horário da Terra e não de Marte. Após o lançamento, Allen acreditava que finalmente poderia descansar, já que é responsável pela parte mecânica. Mas, no dia seguinte ao lançamento, seu telefone tocou. Após a aterrissagem, muitas pedras continuavam na carcaça do robô e podiam danificar equipamentos ou prejudicar os movimentos. O Curiosity foi programado, então, para se movimentar em chacoalhadas, “como um cachorro”. Ainda assim algumas pedras permanecem lá.
“Nós não temos prazos, nem escala industrial. Nosso papel é pesquisar e fazer aquilo que nenhuma indústria fez até agora” – Líder de projeto de sistemas mecânicos do Laboratório de Ciências de Marte (MSL), William Allen.
Para colocar em operação o robô de uma tonelada com suas inúmeras câmeras de altíssima resolução, um braço com muitos graus de liberdade e mecanismos capazes de promover deslocamentos pela superfície do planeta vizinho, a opção foi a energia nuclear. Inicialmente, a ideia foi utilizar painéis solares, mas foi descartada devido às incertezas de condições atmosféricas do planeta, a localização e a necessidade de alcançar grandes altitudes. A instalação do compartimento de energia foi a última coisa feita antes do lançamento e é considerada uma operação à parte, talvez tão difícil quanto a construção do robô, aponta o engenheiro mecânico. “Essa foi nossa única alternativa para garantir energia suficiente ao Curiosity. Provavelmente, as rodas se desgastarão antes da energia acabar”.
A missão deste robô em Marte tem previsão oficial de durar dois anos e após esse tempo deverá continuar enviando informações regularmente para a continuidade de pesquisas, como acontece com os outros equipamentos enviados ao espaço. “Nosso programa de pesquisa em Marte prevê um envio de sondas a cada dois anos, nem todas do porte do Curiosity. A intenção é enviar astronautas até 2050”, explica o engenheiro mecânico do JPL.
Parceria
O PLM Teamcenter da Siemens foi fundamental no trabalho de integração de todas as etapas do projeto. Além disso, a empresa também contribui no fornecimento de uma grande quantidade de componentes que fizeram parte do projeto da NASA. Entre pesquisadores do JPL e colaboradores externos, 1.500 pessoas estavam envolvidas. O aperfeiçoamento dos módulos e o desenvolvimento de interfaces mais intuitivas foram mudanças que fizeram do Teamcenter a melhor opção para o projeto.
De acordo com o engenheiro mecânico, não foram necessárias customizações no programa da Siemens, mas replicaram um sistema de análise da própria NASA ao programa. “O livro de códigos desse sistema é desta grossura [faz sinal com os dedos]. Nós mostramos para outras empresas e elas nem quiseram tocar no material. A Siemens voltou com a solução em duas semanas, aproveitamos para adicionar mais outras funcionalidades e o produto ficou cem vezes melhor que o inicial.”
A disputa por orçamento é uma dificuldade mesmo na NASA. Quando o último robô foi projetado, a previsão era de que ficasse no espaço por, no máximo, três meses. Passaram-se nove anos e as sondas enviadas a Marte continuam trazendo informações importantes. Se por um lado isso traz orgulho para os pesquisadores da NASA, por outro o sucesso da operação também aumenta a responsabilidade das próximas. O número de exigências para a liberação de recursos para as pesquisas aumenta e o financiamento das pesquisas é algo que tem preocupado o engenheiro mecânico. O presidente reeleito Barack Obama anunciou, ainda no começo do ano, cortes no orçamento de 2013 em projetos da NASA e o programa de exploração de Marte, um dos mais afetados, terá redução de 226 milhões de dólares.
As preocupações de uma agência de pesquisas divergem bastante das encontradas em uma indústria, pois quase tudo é protótipo, ou seja, nunca foi feito antes e, conforme afirma Allen, tudo o que fazem está em constante desenvolvimento e aperfeiçoamento. Contudo, poder trabalhar de modo dinâmico e aplicando os princípios da engenharia simultânea (vários especialistas trabalhando em tempo real em um mesmo projeto) reduz sobremaneira o tempo necessário para o alcance de metas com custos muito menores, o que favorece no encaixe das pesquisas em orçamentos cada vez mais reduzidos.
“O trabalho de laboratórios como JPL contribui muito para o desenvolvimento de novos processos e produtos para a indústria. Não são investimentos que serão perdidos”, Troy Vanderhoof, diretor de marketing da Siemens PLM para as Américas.
Reforçando a necessidade de investimentos nessa área, Vanderhoof complementa: “O trabalho de laboratórios como JPL contribui muito para o desenvolvimento de novos processos, produtos para a indústria. Não são investimentos que serão perdidos”. Entre as contribuições importantes dos estudos espaciais para a criação de novos produtos em terra, o diretor cita as pesquisas com fibra de carbono, largamente utilizadas por diversos setores da indústria. “Uma mudança que tenho observado nos Estados Unidos é que comumente só as grandes empresas tinham a capacidade de obter esse conhecimento, como General Motors e Apple. Hoje, há inúmeras pequenas empresas desenvolvendo novos produtos inovadores e elas são 93% das empresas nos Estados Unidos e Canadá”.
Como se vê, embora mantidas as diferenças entre as prioridades das indústrias em comparação com as das agências de pesquisa, não há dúvida de que a tecnologia da informação aplicada ao gerenciamento de projetos é um caminho sem retorno. Todo trabalho que careça da integração de vários departamentos, no desenvolvimento de módulos que precisam se ajustar com perfeição entre si, em termos de prazo, qualidade e precisão, só alcançará níveis máximos de competitividade com a ajuda desse tipo de suporte. Fique atento!
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Sou um dos seguidores do seu blog já há algum tempo e sempre achei seus posts ótimos. Espantoso é que você não cobra nada por essa fonte de informação. Muito claro e explicado, meus parabéns!
Olá Paulo
obrigado por participar
aTT
M&F
Olá
obrigado pela leitura e pelo apoia
att
A integração de processos é fundamental em qualquer setor da industria e esta matéria reforça ainda mais essa idéia. Parabéns, o conteúdo é muito interessante e agradável.
Olá Patrick, tudo bem?
Obrigado pelos comentários. Siga participando e sugerindo se achar que deve
Att
André e Equipe M.em Foco
Matéria excelente. Vocês estão de parabéns por nos proporcionar uma matéria tão rica em informações.
Olá Samuel
obrigado pelo incentivo! sempre que possível encaminhe seus comentários
att
André Berté
Excelente matéria e texto. Ficou um texto bem objetivo e claro. Parabens Juliana.