A arte de delegar com eficácia
A delegação é um recurso valioso para o líder, pois favorece a administração do tempo, a organização do trabalho, o aumento da produtividade e, acima de tudo, o desenvolvimento individual das pessoas.
A capacidade de delegar tarefas e responsabilidades de modo eficaz se converte em uma das mais importantes competências de liderança, especialmente quando consideramos que o papel essencial dos líderes é a obtenção de resultados positivos através das pessoas.
De acordo com grande parte da literatura gerencial e corporativa, a delegação é o processo de transmitir determinadas tarefas, obrigações e responsabilidades de uma pessoa para outra; normalmente, de um superior a um subordinado.
A delegação é um recurso valioso para o líder, pois favorece a administração do tempo, a organização do trabalho, o aumento da produtividade e, acima de tudo, o desenvolvimento individual das pessoas. É por meio da delegação que o líder consegue aumentar o nível de maturidade funcional, satisfação e motivação de seus seguidores e, por consequência, formar sucessores que possam assegurar a manutenção dos padrões de qualidade e os diferenciais competitivos da empresa. Além disso, quando o líder delega tarefas e responsabilidades, ele pode se surpreender ao encontrar novas ideias e possibilidades frente a métodos antigos que precisem de reciclagem e atualização.
Apesar desta gama de benefícios e vantagens, não é muito difícil observar certos questionamentos acerca desta prática que, sem a devida tratativa, podem se transformar em sérios obstáculos. Muitos líderes se perguntam se, ao serem delegadas, as tarefas serão desempenhadas com a suficiente dedicação ou seriedade com as quais ele mesmo as executaria. Essa preocupação tem seu fundamento, pois mesmo que uma tarefa seja delegada, a responsabilidade final pelo seu resultado permanece com o líder. Portanto, se houver erros ou qualidade insuficiente, o líder é quem pagará a conta.
Para que essa preocupação tenha menor impacto, é preciso entender que, em um processo de delegação, é esperado um nível “inferior” por parte de quem recebe a tarefa, seja em termos de formação, qualificação, experiência, vivência, maturidade funcional ou comportamento. Para que a pessoa execute a tarefa com o mesmo nível de dedicação e qualidade do líder, ela deveria estar no mesmo nível que ele. Desta forma, o processo não seria de delegação, e sim de substituição, o que por si só poderia de fato despertar o sentimento de insegurança e até mesmo ameaça por parte de quem delega.
Outro aspecto que ajuda no combate a essa preocupação é a constante possibilidade de que a pessoa que recebeu a tarefa a execute de maneira mais rápida, inovadora e eficiente que você. Afinal de contas, as pessoas precisam de oportunidades para que possam mostrar seus talentos, nos surpreender com a sua engenhosidade.
A concessão de margem para erros é outro ponto sensível para a prática assertiva da delegação, uma vez que a pessoa não possui o mesmo nível de maturidade que o líder e a delegação de tarefas faz parte do seu plano de desenvolvimento. Os erros devem ser entendidos e utilizados como oportunidade de aprendizagem e aquisição de experiência. Para tanto, é fundamental que o líder tenha consciência e saiba distinguir quais erros são admissíveis nesse processo e poderão contribuir com o desenvolvimento daqueles que não poderão ser tolerados e que podem vir a prejudicar outras pessoas, colegas de trabalho, clientes e a imagem da empresa no mercado.
Muitos gestores acreditam que já exercem a delegação de tarefas no seu dia a dia. No entanto, isso não acontece de maneira adequada, considerando-se todos os aspectos envolvidos na delegação eficaz. A única preocupação deles é transferir e descarregar a atividade (ou literalmente livrar-se dela) para outra pessoa, eximindo-se de todas as responsabilidades inerentes à tarefa. Esse é o tipo de comportamento que pode ser chamado de “delargação” e pode ser reconhecido facilmente por outras definições como “passar a batata-quente”, “descascar o abacaxi”, “toma que o filho é teu”, “passar o mico”, “se vira, pois você não é quadrado”, dentre outros jargões bastante conhecidos no cotidiano das empresas. Sem contar ainda que a prática da “delargação”, normalmente, envolve aquelas atividades mais chatas, enfadonhas, repetitivas e desagradáveis, o que pode causar indignação, estagnação e considerável diminuição da motivação nas pessoas que as recebem.
É possível perceber essa postura equivocada no processo de delegação quando observamos que o gestor se afasta completamente do subordinado assim que a tarefa foi delegada, ou seja, não existe nenhum tipo de acompanhamento; o gestor só pede um posicionamento quando a tarefa está concluída, o que não permite que a pessoa corrija possíveis erros e desvios; quando transfere as atividades para o subordinado que estiver mais próximo ou mais disponível; quando o gestor se esquece do trabalho, inclusive na hora de cobrá-lo; ou só transfere atividades maçantes e desagradáveis, guardando as atividades interessantes para si mesmo; não demonstra confiança na capacidade que o subordinado possui para realizar o trabalho. Neste tipo de contexto, geralmente as tarefas ficam incompletas ou com qualidade insuficiente e o líder precisa finalizá-las. O subordinado passa a questionar sua qualificação e competência, além de alimentar sentimentos negativos em relação ao gestor, o que pode comprometer seriamente o relacionamento e abalar o vínculo de confiança entre o gestor e o subordinado.
Depois dessas reflexões, o líder pode começar a criar o ambiente adequado para a delegação e deve estar atento a um conjunto de aspectos muito importantes, que funcionam como os pilares de um processo de delegação bem conduzido e que, de fato, pode proporcionar desenvolvimento para quem recebe a tarefa e o reconhecimento do verdadeiro papel do líder que delega.
Não permita que a tarefa fique muito tempo sem seu acompanhamento, pois, como já vimos um pouco antes, a responsabilidade final pelo resultado atingido ainda é do líder.
O primeiro aspecto é a comunicação. É preciso definir claramente a tarefa a ser delegada, com o maior nível de detalhamento e especificidade possíveis. Se a pessoa que recebeu a tarefa tiver dúvidas a respeito do que fazer, como fazer ou até mesmo por que fazer, é possível que o resultado não se apresente da forma esperada. Lembre-se de que o que é óbvio para você nem sempre é claro para as outras pessoas, as coisas óbvias também precisam ser ditas. Uma boa alternativa para verificar a qualidade da sua comunicação é pedir para a pessoa parafrasear (ou até mesmo repetir) o que você acabou de solicitar. Desta forma é possível avaliar o nível de compreensão acerca do que foi pedido e eventualmente esclarecer pontos de dúvida antes de a tarefa ser iniciada.
O segundo aspecto é o planejamento, que é essencial em praticamente todos os aspectos da vida cotidiana. O líder deve preparar a delegação da tarefa com antecedência, reunindo todas as informações e materiais necessários para o seu adequado desempenho e, sobretudo, instruindo, treinando e capacitando a pessoa que receberá a tarefa. Essa preparação requer uma boa dose de disciplina, administração do tempo e, principalmente, conhecimento e análise frequente da equipe. Nesta análise, é importante considerar se a pessoa para a qual você pretende delegar uma tarefa tem compreensão dos objetivos departamentais e empresariais; se ela apresenta as habilidades necessárias para a execução da tarefa de modo correto e no prazo estimado; se ela já executou alguma atividade semelhante antes e se costuma seguir os procedimentos recomendados; quais são seus pontos fortes e potenciais de melhoria; se você confia suficientemente nela e acredita que a tarefa será realizada com êxito; se ela tem interesse na tarefa; se a tarefa se encaixa nos prazos dessa pessoa. Finalmente, procure avaliar se a pessoa aprenderá com a experiência e se a delegação trará benefícios a você e aos outros membros da equipe.
Uma vez que o prazo para a execução da tarefa faz parte da análise que antecede a delegação, é válido investir um pouco mais nesse aspecto. O líder deve definir claramente o prazo no qual a tarefa deve ser concluída. Termos como “urgente”, “para ontem” ou “o mais rápido que você puder” não são prazos. Um prazo é composto por uma data ou um horário e deve ser determinado de acordo com a complexidade da tarefa. Lembre-se que um tempo adequado para execução da tarefa é um fator determinante para a qualidade do resultado que será atingido. Nunca encare e nem delegue prazos irreais, mesmo que isso pareça ser o modelo de funcionamento atual de muitas empresas.
A autonomia também é um aspecto importante. Defina claramente o nível de autonomia da pessoa ao delegar a tarefa, isto é, onde ela pode usar sua criatividade, sua flexibilidade e o que ela deve fazer conforme a sua determinação. O nível de autonomia está diretamente relacionado à possibilidade de tomar decisões e as decisões de um subordinado podem causar impactos, inclusive para a credibilidade da liderança.
Depois que a tarefa foi delegada, considerando- se os aspectos apresentados, o trabalho do líder continua, visto que é necessário fazer o acompanhamento. A rotina de acompanhamento também está diretamente associada à qualidade do resultado. Marque reuniões de verificação para saber como a tarefa está sendo executada, ofereça orientações e faça retificações se for necessário. No início, essas reuniões devem ser imediatas e frequentes, depois você pode aumentar os intervalos à medida que observa a evolução de quem executa a tarefa. Não permita que a tarefa fique muito tempo sem seu acompanhamento, pois, como já vimos um pouco antes, a responsabilidade final pelo resultado atingido ainda é do líder.
É bastante provável que o desenvolvimento seja o principal aspecto e também o principal benefício proporcionado pela delegação. Somos receptivos a situações novas e mais difíceis se, primeiro, obtivermos êxito em outras situações menores e mais simples. Portanto, se a pessoa começa a receber tarefas simples, tem o devido acompanhamento e toma consciência de que está se saindo bem, ela terá maior prontidão e disponibilidade para receber tarefas maiores e mais complexas.
Além da aprendizagem específica sobre a tarefa que foi executada, o processo de delegação contribui significativamente para o aumento da maturidade funcional das pessoas, ou seja, eleva o nível de autonomia, configura e mantém a atmosfera de aprendizado contínuo, estimula perguntas e diálogo aberto, incentiva à atitude participativa e responsável, estimula o questionamento positivo diante de tarefas e procedimentos que precisem de revisão ou atualização e, principalmente, possibilita a percepção de uma experiência de evolução e crescimento profissional.
Quero finalizar esse artigo com uma citação de Ram Charan, um dos mais reconhecidos pensadores da área de gestão e liderança da atualidade, que diz: “o seu maior multiplicador é ter a pessoa certa no lugar certo”. A delegação eficaz é uma dos melhores caminhos para conseguirmos esse feito. Um grande abraço e até breve.
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.
There are no comments
Add yours