Os ladrões do tempo
Nunca um assunto foi tão presente em nossas conversas quanto a “sagrada correria de todos os dias” e a quantidade insuficiente de tempo para que possamos dar conta dos inúmeros compromissos, eventos e tarefas da agenda.
As horas e os dias passam voando. Basta piscar os olhos para perceber que já são 18h, que já é sexta-feira, que o mês acabou e que mais um ano chegou ao fim. As crianças crescem tão depressa, que frequentemente precisamos recorrer a fotografias e outras lembranças para podermos assimilar melhor a passagem do tempo.
Quando percebemos, passaram-se 10 anos de nossa vida e nem sempre conseguimos realizar todos os nossos planos e objetivos da maneira como gostaríamos ou planejamos. Mas é em meio a todo esse intenso movimento que precisamos abrir verdadeiramente os olhos diante de algumas questões e hábitos diários que à primeira vista podem parecer inofensivos, mas são competentes o suficiente para invalidar todas as nossas tentativas de construir uma relação mais saudável e mais produtiva com o tempo.
Antes mesmo de conhecer e adotar metodologias comprovadamente eficazes para a gestão dos eventos diários, convido- -o a fazer uma autoanálise e observar suas atitudes e costumes frente aos quatro grandes ladrões do tempo: a tecnologia, a procrastinação, o perfeccionismo e a desorganização. Vamos começar pela tecnologia, que invadiu nossas vidas de uma forma tão profunda que já não se consegue imaginar como era a vida (e o trabalho) antes da internet, do e-mail, do smartphone, do Whatsapp e de tantos outros aplicativos que trazem mais inteligência, velocidade e praticidade para o nosso dia a dia.
Não há dúvida de que a tecnologia é uma poderosa aliada para a construção dos resultados desejados. Mas para que ela se preste de fato a esse objetivo é preciso determinar e respeitar um limite do tipo “quem controla quem”, principalmente no que se refere ao uso produtivo e consciente do tempo.
Tenho certeza de que você já reparou o quanto algumas pessoas se deixam controlar completamente por seus smartphones. Basta ir a um restaurante e observar o comportamento das pessoas à mesa. Manter o celular fora do campo de visão tem sido uma tarefa cada vez mais difícil.
Funciona mais ou menos assim: “Só vou dar uma olhadinha na minha linha do tempo, postar uma informação importante e compartilhar um vídeo. Em cinco minutos estarei de volta ao trabalho.” Acontece que o ambiente das redes sociais é tão atrativo e cheio de conteúdos que vem ao encontro do seu interesse e necessidade (sim, elas já sabem do que você gosta ou precisa!), e quando você se dá conta, aqueles cinco minutos que você havia planejado já viraram 20, 30 ou 40.
Algumas pesquisas nos ajudam a entender melhor esse fenômeno e podem trazer estímulos adicionais para que você aceite o convite que lhe fiz ainda há pouco. Os brasileiros são líderes no tempo gasto nas redes sociais, 650 horas por mês, uma média 60% maior do que a do resto do mundo (Digital Future Focus Brazil 2015). Estudantes passam até 10 horas por dia mexendo em seus smartphones (Universidade de Byron, 2014). Para cada hora gasta com as redes sociais, cerca de 16 minutos de trabalho são perdidos; no final de um dia, cerca de seis horas e meia escorrem pelo ralo; ao longo do mês, são oito dias a menos de trabalho e isso deixa um saldo tão negativo que equivale a cerca de 25% a menos de produtividade (Instituto de Tecnologia Política de Washington, EUA). E a perda não se dá apenas no âmbito da produtividade, o uso excessivo de redes sociais também afeta o sono e reduz o número de encontros presenciais com os amigos.
Agora, contabilize esses números em relação à quantidade necessária de tempo para atender a todos os seus compromissos, executar todas as suas tarefas, cumprir todos os prazos com os quais você se comprometeu, trabalhar, estudar, cuidar de si mesmo e da família, se divertir, descansar e todas as demais demandas da vida. A conta não fecha.
Mesmo que você faça uso dos aplicativos específicos que controlam a quantidade de horas em que você está utilizando seu smartphone, ainda assim você precisa definir e respeitar o limite de tempo que essa atividade deve consumir do seu dia. Do contrário, suas prioridades estarão sempre vulneráveis a esse desperdício de tempo.
A procrastinação também é uma ladra de tempo que merece sua atenção. Procrastinar consiste no hábito de adiar tudo até o limite máximo dos prazos, vivenciar diariamente aquela sensação de pânico do último minuto. Essa atitude acarreta não somente à perda ou ao mau uso do tempo, mas também traz decréscimo na qualidade e no nível de energia.
A tendência de procrastinar geralmente aparece diante daquelas atividades chatas, difíceis ou demoradas, porque o cotidiano não se compõe apenas de tarefas que nós gostamos de realizar. Você já viu alguém procrastinar uma happy hour com os amigos? Ou uma sessão de cinema? Um churrasco? Ou ainda a manutenção diária da sua rede social? Eu nunca vi.
Todas as pessoas, em algum momento, estão diante de tarefas desagradáveis. Na opinião de alguns especialistas em comportamento, a procrastinação é antes de tudo, um sintoma de baixa autoestima. Uma vez que a pessoa deixa suas tarefas e obrigações para depois, ela está indiretamente se deixando para depois também, deixando de valorizar suas próprias escolhas e prioridades.
O costume de “empurrar com a barriga” ou “deixar para amanhã” nunca vai permitir que você construa uma agenda realista e efetiva para o seu dia. Pelo contrário, vai encher sua cabeça de preocupação diante de tantas coisas que você ainda tem por fazer, especialmente se algum imprevisto o impedir de entregar uma tarefa naquele último minuto que ainda lhe resta de prazo. Vale ressaltar ainda que os imprevistos sempre acontecem, todos os dias.
Uma alternativa para vencer a procrastinação é tomar consciência dos reais motivos que o fazem adiar tarefas e, acima de tudo, melhorar o nível de disciplina. Lembre-se que disciplina se resume em fazer o que precisa ser feito, na hora que precisar ser feito.
Estabelecer prazos para você mesmo e fazer a tarefa logo cedo também costumam ajudar. Deixar para “mais tarde” cria ansiedade e mantem ativa a preocupação com a tarefa, ou seja, você consegue adiar a tarefa no plano físico, mas isso não acontece no plano mental.
Cultive o hábito de dar a si mesmo uma recompensa a cada tarefa executada prontamente e escapar da tendência de procrastinação. Alimente sua autoestima com a satisfação de concluir um trabalho na hora certa.
Agora vamos falar um pouco sobre o perfeccionismo, que também rouba uma significativa parcela de tempo de muita gente.
É fato que nos dias atuais, a qualidade é um quesito inquestionável. Todos nós normalmente alimentamos uma exigência de fazer e esperar sempre o melhor. Mas a linha que separa o perfeccionismo saudável do perfeccionismo nocivo é muito tênue e pode passar despercebida com grande facilidade.
O perfeccionismo saudável é ligado às questões de qualidade e excelência, à constante vontade de fazer uso pleno de suas competências para a construção de um resultado exemplar. Não é preciso reforçar o quanto essa característica é requisitada e valorizada no mundo do trabalho, por exemplo.
Já o perfeccionismo nocivo é aquele que dificulta a entrega. Pessoas que alimentam autoexigências excessivas e também exigem perfeição por parte dos outros podem fazer com que qualquer tarefa não tenha fim. Pessoas perfeccionistas ao extremo podem também, de modo inconsciente, alimentar o medo de decepcionar os outros e a si mesmas, de forma a não querer concluir as atividades para que não sejam alvo de uma possível avaliação negativa. Lembre-se de que todos nós temos limites e que o ótimo, algumas vezes, pode ser inimigo do bom.
Para finalizar, vamos falar sobre a desorganização, que também pode minar até mesmo as mais eficazes técnicas de planejamento e gestão do tempo. Coisas fora do lugar ou atividades executadas sem métodos e procedimentos podem atrasar sua vida. As pessoas quem mantém suas mesas, gavetas e armários organizados, que criam um sistema lógico para arquivar dados no computador, que colocam o celular e as chaves sempre no mesmo lugar e que planejam na véspera o que irão vestir, geralmente ganham tempo.
Existem estatísticas que mostram que uma pessoa desorganizada pode perder até 28 minutos por dia procurando informações que já possui, mas não sabe onde estão guardadas.
Já imaginou como seu dia poderia ser diferente se você tivesse esses 28 minutos para cuidar de si mesmo? Ler um bom texto, o capítulo de um livro, fazer uma caminhada, degustar melhor seu almoço, tomar um café com um amigo, ouvir suas músicas preferidas, brincar com seu filho, levar seu cachorro para um passeio, assistir um episódio da sua série favorita, namorar um pouco mais, ou simplesmente ficar sem fazer nada e aproveitar os benefícios do ócio.
Além disso, um ambiente desorganizado também gera ansiedade e drena sua energia, algo que a filosofia japonesa do 5S já comprovou com evidências incontestáveis. Essa filosofia defende a utilização de cinco comportamentos (sensos) que garantem um melhor nível de organização: Seiri (utilização), Seiton (arrumação), Seiso (limpeza), Shitsuke (disciplina) e Seiketsu (higiene).
Hoje em dia, existem muitos livros, artigos e blogs que compartilham dicas valiosíssimas para quem deseja organizar melhor o ambiente e a rotina. Também existem profissionais especializados que podem ajudá-lo com essa questão. No entanto, mais importante que fazer um “dia de arrumação”, colocando todas as coisas no seu devido lugar, é manter esse hábito todos os dias. Lembre-se: manter mudanças requer mais esforço do que iniciá-las.
Espero que essas reflexões o ajudem a se proteger da influência negativa desses quatro ladrões de tempo. Desta forma, você estará mais atento e consciente para cuidar de suas prioridades e aumentar o nível de satisfação seus resultados.
Um grande abraço e até breve.
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